por: Alvaro Ricardino
Doutor em Controladoria e Contabilidade da FEA/USP
Professor e Pesquisador da FUCAPE – Fundação Instituto Capixaba de Pesquisas em
Contabilidade, Economia e Finanças
Este trabalho se propõe a preencher uma pequena lacuna da história da contabilidade brasileira relativa a criação, implementação e desenvolvimento das Aulas de Comércio em Lisboa, Rio de Janeiro e, mais especificamente, no Maranhão, no início do século XIX.
Pretende, também, apresentar ao público, principalmente àqueles localizados nos estados do sul, um escritor maranhense, lente da Aula de Comércio, que, em 1834, escreveu e publicou um dos primeiros livros sobre contabilidade na história do Brasil, cujo conteúdo será resumidamente comentado.
Por último, deseja chamar a atenção para o amplo desconhecimento dos aspectos históricos que envolvem nossa contabilidade. Utilizando alguns textos, com objetivos meramente exemplificativos, o autor se propõe demonstrar como o desconhecimento e, principalmente, a falta de embasamento científico, levam à público informações incompletas ou, eventualmente, errôneas.
Um dos inúmeros aspectos que permanecem desconhecidos a respeito do desenvolvimento histórico da contabilidade brasileira diz respeito aos momentos iniciais do ensino da disciplina em nosso país. As poucas informações disponíveis a este respeito procedem de citações esparsas, apoiadas em textos legais ou extraídas de trabalhos diversos, num processo contínuo de “requentamento” da informação, muitas vezes equivocada. Dois exemplos desse minimalismo histórico são demonstrados a seguir.
O primeiro diz respeito ao ensino contábil. Segundo o autor, cujo nome se preferiu omitir, “os primeiros passos para o ensino da Contabilidade em nosso país foram dados no século passado. Em ordem cronológica foram:
· 1808 – Em 23 de fevereiro, criação da Cadeira de Economia Política, que, foi mais tarde denominada “Aula de Comércio”, pelo Decreto 456 de 6 de julho de 1846.
· 1810 – Criação da Academia Real Mineira.
· 1856 – Criação do Instituto Comercial do Rio de Janeiro por transformação da “Aula de Comércio”.
A julgar pelo tempo decorrido entre os três eventos - quase cinqüenta anos - ou não ocorreu nada neste país ou não conhecemos nada do que, de fato, ocorreu neste período, no que diz respeito à contabilidade.
O outro exemplo, agora direcionado à produção literária brasileira, pode ser extraído do seguinte texto:
“Dentro deste contexto puramente escritural da Contabilidade brasileira, Veridiano de Carvalho publicou o livro Manual Mercantil, em 1880, representando uma das primeiras e mais importantes colaborações para a divulgação e consolidação das partidas dobradas no Brasil.”
Embora o autor ressalve a sentença com a expressão “uma das primeiras”, é certo que outras publicações antecederam a esta e, fundamentalmente, o uso das partidas dobradas já estava implementado entre nós, desde a Inconfidência Mineira, em 1780. Sua consolidação se faria gradativamente, a começar pelo Édito Real de 28 de junho de 1808, onde D. João VI ordenava que a escrituração da Real fazenda Portuguesa se fizesse através de partidas dobradas, “por ser este o único método adotado pelas nações civilizadas”. No cinqüenta anos subseqüentes, as Aulas de Comércio se encarregariam de ensinar contabilidade aos estudantes brasileiros, inclusive pelo método das partidas dobradas. Anos mais tarde, em 22 de agosto de 1860, a Lei 1083 se encarregaria de sacramentar a utilização do método ao estabelecer os parâmetros para funcionamento das Sociedades Anônimas no Brasil. Em 03 de novembro daquele mesmo ano, o Decreto 2.679 regulamentaria a citada Lei e estabelecia padrões contábeis de publicações de balanços através das partidas dobradas. Estava editada a primeira Lei das Sociedades Anônimas no país.
Não é objetivo deste trabalho criticar este ou aquele autor. O que se tem em mente é chamar atenção para o quanto a contabilidade brasileira é órfã de suas origens e o quanto há de pesquisas a ser realizada neste campo. E as pesquisas a serem realizadas deveriam ser preferencialmente primária, como forma de resgatar a verdadeira história da contabilidade brasileira, e alertar para o risco de referenciar trabalhos, produzidos sem o correspondente arcabouço científico. Se houvesse ampla compreensão de que os dados do conhecimento científico requerem evidência adequada antes de poder ser aceitos, adverte SEGAN (1996, p. 20), não haveria espaço para a pseudociência.
Quando uma tese ou dissertação chega às prateleiras de uma biblioteca, passa a servir de fonte de consulta e referencial para estudantes e outros autores, posto que seu conteúdo é aceito como expressão científica da verdade. A referência da referência, que muitas vezes tem como origem material extraído de revistas ou outras fontes descompromissadas com a pesquisa científica, deveria ser cuidadosamente analisada, antes de ser levada à público.
Este trabalho, utilizando material de pesquisa primária e secundária, pretende preencher uma pequena lacuna relativa ao ensino e ao material didático utilizado nas Aulas de Comércio no início do século XIX, no Brasil, mais especificamente na cidade de São Luiz, no Maranhão.
Para melhor compreensão das circunstâncias que permeiam a introdução de tais Aulas, naquela cidade, em 1811, será produzido um breve preâmbulo das atividades econômicosociais relativa àquele período.
Fonte:
http://www.fucape.br/_admin/upload/prod_cientifica/prod_2001-45metafisica.pdf
0 comentários:
Postar um comentário